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A Nossa Gente
Falar da Nossa Gente é trazer à memória algumas figuras relevantes da nossa Terra.
Naturais do Município de Ílhavo, ou embora não o sendo, assumiram este como seu, destacaram-se ou destacam-se, deixando o seu legado em diferentes áreas. Mesmo correndo o risco de não serem todas citadas, deixamos aqui uma lista dos vultos que mais exerceram influência na sociedade ilhavense.
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Ângelo Valente e Sofia Nunes
Destacamos dois dos jovens mais dinâmicos e notáveis do concelho: Ângelo Valente e Sofia Nunes. É já praticamente impossível falar em gerontologia em Portugal sem mencionar o Centro Comunitário da Gafanha do Carmo. E é muito por causa deles. Ângelo Valente é animador social, Sofia Nunes é gerontóloga. Quando, em 2011, o Centro Comunitário da Gafanha do Carmo os juntou, poucos meses depois de abrir portas, estavam longe de imaginar que viriam a formar uma equipa tão popular.
A premissa que os inspira é simples, embora concretizá-la seja um desafio diário: multiplicar a felicidade, dividindo-a. “Ver cada pessoa feliz” é, de resto, assim que a dupla resume o objetivo daquilo que é mais que um trabalho. Para Ângelo e Sofia, estar no Centro Comunitário é estar em casa, em família, “rodeados de pessoas, música, abraços, amizade, do Vadio e da Viana”. Vadio e Viana são os cães de estimação do Centro Comunitário da Gafanha do Carmo, verdadeiras sessões de terapia em quatro patas. Foram ambos adotados pela instituição e são fortes aliados no combate à depressão e à solidão dos utentes. Têm sido, provavelmente, dois dos cães mais mediáticos do país, nos últimos anos, acompanhando Ângelo e Sofia em todas as suas intervenções.
Foi em 2014, com um vídeo que parodiava o da música “Wrecking Ball”, de Miley Cyrus, que Ângelo Valente e Sofia Nunes perceberam que tinham as armas certas para fazer algo diferente: um sentido de humor consciente, mas desprovido de pudores, a “família” certa e as redes sociais, que os erguiam no número de seguidores muito rapidamente.
Entre esse vídeo e serem a equipa que dá a cara pelo lar mais conhecido do país, passou menos de um ano. Centenas de entrevistas, reportagens inteiramente dedicadas a eles, um “Alta Definição” (SIC) com o utente Alfredo, duas conferências Futuridade com lotação esgotada e convidados como Daniel Oliveira, Marisa Matias, Nuno Markl, Fernando Alvim ou Manuela Ferreira Leite. Ângelo e Sofia têm o currículo cheio, mas isso nem os preocupa muito.
O que realmente lhes importa é a quantidade de sonhos que já conseguiram concretizar, o número de pessoas que se identifica com eles e os que já não têm medo de envelhecer, graças a eles. “A missão é desmistificar a velhice e a institucionalização, sensibilizando a sociedade para se tornar mais integradora de forma a que todos possamos envelhecer de forma livre, autónoma e feliz” e, para isso, o animador e a gerontóloga garantem que é muito importante que, mesmo depois de envelhecer, seja “valorizado o potencial de cada ser humano, o contributo de todos, independentemente da sua condição ou faixa etária”.
A equipa assume que a institucionalização é “um evento marcante na vida de qualquer pessoa e exige muito, até da família, principalmente ao nível emocional”. Mas, Ângelo e Sofia garantem que as melhores respostas são “o amor e a aceitação” e que, na maior parte dos casos, a adaptação é bem-sucedida e grande percentagem dos utentes acaba por reencontrar, no Centro Comunitário da Gafanha do Carmo, “uma felicidade que já julgava extinta”.
Quem os conhece e está atento ao seu trabalho, à ligação que estabelecem com os que os rodeiam, percebe perfeitamente porquê. Ângelo e Sofia merecem tudo de bajulador que se diga sobre eles. Nossa gente: resta-nos agradecer que nos multipliquem a felicidade, juntando-se.
Julho 2017
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Vasco Ramalheira
Nos anos 80, quando Vasco Ramalheira começou a surfar, tinha ainda 14 anos, ser surfista impunha alguns rótulos e ele e os seus amigos de então, os que também se aventuravam no mar, eram vistos como uma tribo à parte. E nem sempre era bom.
Passados trinta anos, o surf passou de um desporto de lazer, quase de culto, a um desporto de competição. Será, aliás, uma das modalidades da próxima edição dos Jogos Olímpicos, em Tóquio, no Japão, em 2020. Mas não será só isso, garante o surfista e vice-presidente da Assembleia Geral da Associação de Surf de Aveiro. Ser surfista, nesta altura do “campeonato”, é ter uma importância social que é sustentada na enorme responsabilidade que é serem os guardiões permanentes das praias, “as pessoas preferem praias onde estão surfistas, confiam em nós tanto ou mais que nos nadadores salvadores, ainda que estes não deixem de fazer o seu trabalho”.
Não são números que apareçam nos relatórios de salvamentos, mas muitos são os banhistas que os surfistas retiraram da água ao longo de todos estes anos, incluindo nos meses da época balnear, quando as praias estão vigiadas. Isto tem uma importância social muito grande. Guardiões das praias. Os rótulos continuam e ainda bem. Vasco Ramalheira é licenciado em design.
Estudou em Tomar, trabalhou numa agência de publicidade em Lisboa, foi para Nova Iorque, onde estagiou em dois ateliers de design, voltou para Ílhavo, foi professor de desenho e abriu o seu próprio negócio, a GIZ Design, onde desenvolve projetos de design e comunicação. Além de surfista, é dirigente da Associação de Surf de Aveiro (ASA) e tem o curso de juiz de surf, tendo já avaliado provas a nível nacional, europeu e mundial. Ligou-se à ASA no final dos anos 80, pouco depois desta surgir.
Em 2005, juntamente com o amigo Luis Ferreira criam o Miss Sumol Cup (atual Miss Activo Cup), evento que junta as melhores surfistas nacionais e as melhores bodyboarders europeias e mundiais, durante cinco dias, na praia da Costa Nova. Acontece, este mês, a 13ª edição de uma prova que tem sido um sucesso, não só a nível da satisfação das competidoras e das federações, portuguesas e europeias, como do ponto de vista turístico, tornando o município e as suas praias cada vez mais atrativos. Vasco Ramalheira afirma que o Miss Activo Cup “permite uma maior divulgação das nossas praias, coisa que não se conseguiria com uma competição local, tão pouco nacional, - este é um evento que traz muito reconhecimento e visibilidade às praias da região”, garantindo que ao longo dos cinco dias do evento, e também nos meses seguintes, passam por ali muitos amantes dos desportos de ondas, tudo graças às ondas ilhavenses.
Um evento com várias provas para as concorrentes nas modalidades de surf e bodyboard, mas que também é aberto à população, não só enquanto público, mas enquanto participante: há experiências de surf e slackline, que embora seja diferente do surf, é utilizado para potenciar o equilíbrio e a dinâmica do corpo. “É um evento em que tudo se combina, há desporto, competição, há ligação com as atletas, que também participam nas experiências de surf oferecidas ao público e, além disso, tem uma componente social que não poderia faltar: por cada onda surfada, o Activo Bank atribui um euro ao Lar do Divino Salvador, em Ílhavo”, afirma Vasco Ramalheira. “Os tempos mudaram”, desabafa, “há doze anos ninguém acreditava no surf, mas hoje temos nomes como o Frederico Morais, o Kikas, que passou várias vezes na Costa Nova, que está no circuito mundial, tudo mudou”, conclui com orgulho. Surf, design e ainda há tempo, sobretudo vontade, para a música.
Há alguns anos, por mero acaso, através da sua ligação profissional a uma discoteca da região, pôs alguns discos da família à disposição de uma festa temática. Desde então tem passado por bares, festas e passa pela segunda vez no Festival do Bacalhau, na terceira noite do certame, para mais uma dose de soul, funk e outros apetites. Mas não lhe chamem “dj”. A música é um prazer.
Agosto 2017
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José Rodrigues Vareta
Nascido na Gafanha da Nazaré, a 24 de outubro de 1930, o Mestre Vareta estudou na Escola Primária da Chave, onde estudou até à 4.ª classe. Com apenas 14 anos de idade, começou a trabalhar como ajudante de Carpinteiro Naval nos antigos Estaleiros Mónica, empresa de referência na construção de navios da frota bacalhoeira nacional. Tornou-se, depois, Carpinteiro Oficial passando pelas suas mãos navios como o “Condestável”, o “Lutador” ou o “Inácio Cunha”, destacando o “Celeste Maria” e o “Ilhavense” como muito especiais.
Tempos bons aqueles em que via partir os navios para a Faina Maior, a pesca do bacalhau à linha praticada por homens e navios portugueses durante os séculos XIX e XX, regressando meses mais tarde, abastecidos de bacalhau, ao Cais dos Bacalhoeiros, na Gafanha da Nazaré, onde, sempre que podia, os ia apreciar. Reformado desde os 65 anos, passou a dedicar-se à construção de miniaturas de barcos e outros apetrechos de madeira, autênticas réplicas de navios bacalhoeiros, dos seus dóris e de diversos utensílios usados pelos pescadores, como o foquim ou a bilha.
O Mestre Vareta estará para sempre ligado à Sala da Faina Maior Capitão Francisco Marques do Museu Marítimo de Ílhavo: fez parte do grupo que construiu, em tamanho real, o belo iate da pesca do bacalhau que se encontra no centro daquela sala, representando um navio típico das primeiras décadas do século XX. Talhado a meia água ou pelo limite inferior do convés, permite aos visitantes ir a bordo e tocar todos os elementos materiais que faziam parte da grande faina. Foi um desafio lançado pelo Capitão Francisco Marques que José Vareta aceitou com muito orgulho, recordando o antigo Diretor do Museu Marítimo de Ílhavo como “um homem com muitos conhecimentos, muito saber e muito simples”.
Com quase 87 anos de uma vida preenchida, o Mestre Vareta continua a fazer aquilo que mais gosta, laborar minuciosamente a madeira, imprimindo arte e amor nas suas peças e recordando, com saudade, histórias da sua vida profissional, tendo sempre como premissa manter-se ativo e útil.
Outubro 2017